Há dias que não queremos que cheguem. Mesmo sabendo que
deles não podemos fugir, lutamos com as forças que nos restam para adiar ou
mesmo anular a sua existência. Mudar o rumo, dar novo sentido ao sentido da
vida, continuar a perseguir um sonho que nos escorrega das mãos.
O dia acordou solarengo e deixei todas as tarefas que sabia
não mais poder adiar para o fim do dia. Andei ocupada em missões que me
mantinham afastada daquele canto do qual queria fugir. Passava e desviava o
olhar. Mas tudo estava lá. Com o cair da noite também o coração começou a
escurecer, a alma perdeu a sua cor e o corpo executava maquinalmente as tarefas
a que estava obrigado. Hoje foi o dia. As minhas mãos, braços e pernas
trabalhavam o mais rapidamente possível para que os olhos nem vissem o que
estava acontecer, na tentativa de esconder do coração, para que não sentisse.
Mas de nada adiantou. Chorei cada peça, cada empreitada das minhas mãos eram
uma lança que me trespassava a alma. Mas tem mesmo que ser? Sim, tem mesmo que
ser.
Hoje empacotei os meus sonhos. Em caixas fuscas que não
queria fechar. Em caixas que não coloquei no fundo do baú, na esperança de que
em breve as possa abrir. Mas o tempo fá-las-á afundarem-se como a areia coberta
pelos estratos superiores, privando-as do oxigénio que as permitiriam viver.
Hoje empacotei os meus sonhos. Há muito luto contra uma corrente inquieta.
Segui-os e persegui-os com perseverança, com suor e muitas lágrimas. Hoje foi
dia de empacotá-los. Sim, eu sei. Sou fraca por desistir. O poeta diz que “o
sonho comanda a vida”, mas para mim é a vida que comanda os sonhos.
Hoje empacotei os meus sonhos, mas vou guardá-los, mesmo que
no fundo do baú, mesmo que sem oxigénio para sobreviverem. Há momentos na vida
assim. Em que temos que deixar os nossos sonhos para podermos avançar num
sentido que nem nos parece o mais apetecível. Há dias assim.
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Texto: Susana Silva
Imagem: Pixbay
Sem dúvida amiga, quantas vezes empacotados os sonhos à espera de uma oportunidade. Obrigada pela partilha, sempre com muita reflexão à mistura. Beijinhos
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