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Mensagens

A mostrar mensagens de abril, 2019

Homenagem às sapatilhas

----- Texto Susana Silva, originalmente publicado em 77palavras 

saudade (em 77 palavras)

---- Texto Susana Silva, originalmente publicado em 77 palavras

Sobre a felicidade

Feliz o que tem esperança, porque sabe que alcançará, confiando no tempo para que traga o tempo certo e nas suas pernas para que percorram o correto caminho e nas suas mãos para doar os preciosos dons. Feliz o que acredita porque confia-se por inteiro e deixa-se alcançar pelas graças da vida que sabe serem para si e que dão fôlego ao seu firme caminhar. Feliz o que tem fé porque nunca está só. Sobe às montanhas mais altas por caminhos escarpados e alcança as mais belas paisagens. Sabe-se inteiro e abre os seus olhos, ouvidos e coração ao sol que o rodeia e à leve brisa que refresca a sua pele. Feliz o que vive com esperança, acreditando sempre na força da sua fé. ---- Texto: Susana Silva

Liberdade

A liberdade é ser fiel, é ter valores que condicionam, é ser-se inteiro sem se deixar corromper.  Liberdade é ter esperança e ser obreiro enquanto os pés caminham.  É sentir o primeiro raio de sol da manhã, água fresca no rosto e nostalgia ao final da tarde.  É sentir saudade com sorriso no rosto.  É dizer apenas o que vale a pena ser dito, para o melhor do outro.  É enaltecer, parabenizar e agradecer a quem o merece e corrigir com parcimónia aqueles que precisam.  É dar espaço é dar vida.  É dar a mão e ser colo.  É afastar-se e chorar.  É abraçar e comover-se.  Ser livre não é fazer, é ser.  Como a gaivota que voa lá no alto, respeitar os peixes que nadam em mar aberto ou a chita que corre em chão firme.  É amar-se e respeitar-se, amando e respeitando cada um dos outros.  Liberdade não é um estado de espírito, é um modo de vida, de quem se sente e faz feliz a cada dia, com cada pequena coisa. ---- Texto: Susana Silva

Tropeções

Às vezes segues andando no teu caminho quando um estranho alinhamento cósmico conspira esmagando-te e deixando-te como um farrapo velho na berma da estrada, sem esperança, sem força e preenchido de dor e sofrimento na incerteza do agora. Abalroado por todos os lados, sentes o vento que te atira contra as paredes e a chuva que te enregela a pele. Agarrado a uma centelha de esperança, vês um pequeno raio de sol que desponta e traz alguma luminosidade à noite em que te encontras. Quase temes acreditar. Mas uma chama arde dentro de ti, sem nunca se apagar, permitindo-te construíres-te a partir de dentro. Essa fé que te alimenta a alma, busca no amor que tens a força para te ergueres desse chão lamacento e olhar para o raio de sol que ainda te parece uma ilusão. Fechas os olhos e permites-te beber nas fontes da esperança, voltando a acreditar, que é tudo o que te resta, e tudo o que precisas. E por entre a chuva tempestuosa o céu azul vai aparecendo e, lá atrás, o sol brilhará, quase t

A Carta

Olá a todos, Se estais a ouvir esta carta alguma coisa não correu muito bem, ou talvez tenha sido melhor assim. Os últimos tempos foram duros, sofri e senti que muitos de vós sofreram ao meu lado. Mas escrevo-vos porque até no meu sofrimento fui feliz, porque vos tive ali, ao meu lado quando precisei, ausentando-se quando vos pedi. Certamente estranhareis esta minha vontade de que ouvisses esta carta no meu funeral. Os mais próximos conheciam este meu desejo, estou certo que o fazem cumprir com serenidade no coração. Eu deixei de viver, mas a minha vida não chegou ao fim. A prova disso é que estais aqui, entristecidos em volta deste meu corpo, já inerte. Mas afastai essa tristeza. Vivi feliz uma vida dura em que sobrepus sempre as coisas boas às mais nefastas que me foram aparecendo no caminho. Estendi as minhas mãos até onde pude, caminhei com os meus pés nos caminhos por onde tive de ir. Abracei com os meus braços muitos de vós. Senti esse abraço hoje. Lembrem-se de mim,

A cura

Era uma vez uma Maria que não tinha tempo. No meio de uma desenfreada vida, às portas de um esgotamento, foi ao médico em busca da pílula milagrosa. Depois de uma demorada consulta saiu com a receita nas mãos. Só à porta da farmácia viu a prescrição: “5ª feira, 21h, Torre dos Clérigos, grupo C, visita aos sem abrigo”. Amarrotou o papel em fúria, mas no seu coração ficou a mensagem: “- Médico louco” Na hora marcada lá estava, no grupo C, atrás, escondida. E a Maria curou-se. Hoje vive mais, faz mais. O voluntariado foi a pílula mágica. ---- Texto: Susana Silva (para o blog páginas partilhadas ) Imagem: pixabay

Lembro-me...

Lembro-me quanto tu vieste para o teu lugar, o nosso lar. Eu não dormia há uma semana. Naquela noite ficara sentada no chão daquele que iria ser o teu quarto, todo prontinho para te receber. O pai passou a noite na sala, também não conseguiu dormir. Deveríamos sair às 8h de casa, mas às 7 estávamos os dois prontos. Em silêncio, porque o nosso coração estava tão esperançoso como angustiado, tão feliz como amedrontado. Estacionamos em frente à instituição e ali ficámos mudos num tempo de relógio parado, num tempo demasiado demorado. À hora marcada estávamos de pé, com a mão na campainha, imóveis num corpo que formigava por dentro. Já te conhecíamos bem e tu a nós. Mas aquele era o primeiro dia do resto das nossas vidas. Entrámos e sentamo-nos num sofá verde que ficava na entrada enquanto acabam de te preparar. Logo ouvimos os teus passos, a correr, por aquele corredor, especialmente longo naquele dia. Sorriso rasgado, olhos brilhantes e braços estendidos correste para mim num abr

Os livros que somos

Querida mãe , sou a menina do mar , de sobrenome lusíadas , cresço ainda em teu ventre . Conheço o caminho imperfeito do teu amor de perdição , quando sentada comias cebola crua com sal e broa e lá do alto gritavam : – Quem meteu a mão na caixa ? – Tu aninhavas-te naquele labirinto de saudade tentando esquecer os jogos de raiva que se viravam contra ti, era a selva . No teu deserto sova o cântico do Homem e, naquela aparição , o sermão do fogo relembrava-te o auto da barca do inferno em que fizeste a viagem sob a embarcação do Anjo Negro de onde se clamava o Sermão de Santo António aos peixes , neste mundo cão como nós . Dá-me um ano para mudar a tua vida , ensina-me a voar pelos telhados , dá de ti, nada menos que tudo . O sal da língua destravada grita uma mensagem do povo que no ensaio sobre a cegueir a descobre a fórmula de Deus . Esses, os memoráveis , acreditam que não há coincidências . Já eu, só sei que prometo amar , até que um dia hei-de amar uma pedra e assi

magia em mim

Há uma estranha magia em mim que aparece quando caio nos tropeções da vida. Há uma estranha cor em mim que surge nas noites escuras e densas. Há uma estranha vida em mim que nasce quando um desalento moribundo ocupa os meus dias. E nesta estranheza a normalidade de um sorriso que tudo oculta e faz acreditar que tudo o é, mesmo na sua inexistência. Há forças ocultas que me fazem sacudir o pó dos pés dos terrenos onde não quero estar e, sem olhar para trás, seguir numa escalada rumo ao oásis que me sei destinado. Neste caminho pinto de todas as cores a árida paisagem que tenho por companhia, desenhando os mais belos jardins e cursos de água que só eu sei e conheço. Escalando uma montanha, vou só, só eu, comigo própria. Contra o vento que se faz gelado, sinto-me sem arnês que me suporte. Mas uma estranha magia faz-me acreditar e seguir. É o último dia. Finalmente cheguei ao topo da montanha e a imensa alegria que me transborda do peito fica nele contida, pois não há com quem seja pa

o selo

Aquele selo, toscamente colado, atraiu a sua atenção. Há horas que arrumava o sótão de casa da avó. As obras iriam começar em breve, e Ana perscrutava tudo com um sentimento de saudade pela vida passada, as fotografias dos seus pais, que há muito tinham partido pelo mundo para não mais voltar deixando-a com a sua avó que sempre a cuidara com toda a dedicação e o maior amor que Ana conhecera. No meio de um amontoado de cartas, onde Ana procurava referência aos seus pais, para na letra deles os poder, algum dia, compreender, encontrou aquela carta com um selo desenhado com a imagem perfeita do seu rosto. Inicialmente assustada, Ana abriu o envelope e leu uma breve carta: “Amélia, meu amor,  parto esta noite para um triste destino longe de ti. Não mais ouvirás a minha voz, mas a tua ecoará para sempre nos meus ouvidos. Não mais sentirás o meu sabor, mas guardo o teu do último beijo que me deste. Não mais sentirás a minha pele, mas será o calor da tua que recordarei e a força que

A vida a questionar as certezas

Ainda da fila Sofia observava com atenção Nelson tentando reconhecer-lhe o rosto que há anos não via, que mantinha o mesmo ar jovial de sempre e lhe permitiu reconhecê-lo. Aproximando-se da mesa onde ele estava sentado, questionou-o: – Posso fazer-te companhia? Nelson elevou a cabeça na direção daquela voz e reconhecendo a sua amiga Sofia sorriu-lhe e assentiu confirmando a surpresa daquele encontro. – Então como estás? – perguntou-lhe ele  com o ar radiante que ela bem memorizara. – Estou bem, tenho só meia hora para almoço, tenho que me despachar… Nos minutos seguintes conversaram sobre as famílias que construíram, os trabalhos que escolheram e quase se esqueceram dos vinte anos que separaram aquele dia do último em que se encontraram. Sofia sentia borboletas na barriga e um entusiasmo que não conseguia explicar. O relógio parecia andar demasiado rapidamente. – Bem, está na minha hora – disse Sofia levantando-se. Nelson levantou-se para se despedir da amiga. A

O espelho

Olho-me calmamente ao espelho… o que vejo eu? Dedadas, impressões digitais, um canto estalado e um espelho mágico inanimado. Apaixonei-me por ti, caro espelho, naquela feira de velharias, achei-te perfeito para o meu quarto. Quando cheguei a casa lá te coloquei no sítio que por ti sempre esperou, mas naquela noite não consegui dormir. Mudei-te para o corredor, depois para a sala e agora estás escondido atrás da porta, na despensa… – Espelho meu, espelho meu, há alguém mais belo do que eu? E no seu silêncio a resposta óbvia saída de um conto de fadas… Qrshhhhhhh…. Qrssssssss – Oh, o que é isto? Parece estática…O espelho é um velho rádio a sintonizar? E num instante um estranho e pálido rosto aparece naquele baço espelho. – Finalmente, pá! Estava a ver que nunca mais ninguém dizia o raio das palavras mágicas. Mas não leem histórias? Eu entrei claramente em choque e fechei a porta da despensa com um grito, deixando lá dentro o espelho a falar sozinho. Não, não p