Ao olhá-lo sentiu um aperto no peito e um assombramento. Fixou-se
nos seus pés e nas suas pernas para não tropeçar. Deixou a dança terminar e
afastou-se graciosamente da porta, desatando a correr logo que sentiu que
ninguém a poderia ver. Fechou-se na enorme Biblioteca batendo a porta e ficando
atrás como que a segurá-la, quando quem precisava de ser segura era ela mesma.
O medo deu lugar a um pânico descontrolado que culminou num choro compulsivo
que aumentava de intensidade à medida que se deixava escorregar pela porta. A
música ao fundo, os risos e o barulho de festa infestavam o seu pensamento. Que
estava a fazer? Quem era? O que iria ser de si? No instante anterior tinha mais
do que alguma vez sonhara e agora todas as dúvidas assolavam o seu ser. Não
podia casar com aquele homem, não o conhecia. O rosto belo, o ouro e o
romantismo haviam toldado a sua razão. Tinha que fugir. Tinha que arriscar.
Do outro lado da porta um bater suave: toc toc.
Não abriu porque nem o ouviu dado o ruído da sua cabeça.
Passados poucos instantes uma estante move-se assustando-a. Era ele. Novamente
ele. Por entre os esconderijos de um castelo que ele, só ele, tão bem conhecia.
Aproximou-se dela e ao ver aquele pranto recuou, escondendo-se, como se a sua
condição fosse ainda a antiga. Ela olhou-o e um novo pranto invadiu-a.
Estiveram ali o tempo que o tempo não pode contar, porque as horas têm tempos
diferentes no sentir. Finalmente ela decidida levantou-se e dirigiu-se a ele.
Ia acabar com aquilo. Tamanha era a bravura no cérebro que os pés tropeçaram no
volumoso vestido amarelo e ela desequilibrou-se precipitando-se em direção ao
chão. Onde teria caído não fosse ele ter-se levantado num salto (que os seus
dias de besta, tão bem tinham permitido treinar) e segurado o corpo daquela
Bela mulher nos seus braços.
Ela olhou-o. Não reconhecia o rosto, nem as feições, mas os
olhos eram os mesmos. Tímidos e medrosos. Então decidiu arriscar e ficar.
Aquele continuava a ser o seu Monstro e ela a sua Bela.
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Texto: Susana Silva
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