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O melhor está para vir, o livro III



"- Anita, vamos ver a Amália, que já está em casa.
Saltei do sofá com a frase da minha mãe. Já tinham passado tantos dias, que já não os conseguia contar, desde a última vez que estivemos juntas. Estava cheia de saudades. Estava pronta, à porta, num minuto. Caía uma chuva forte, e estava frio, embora a primavera já tivesse chegado, tinha-se afastado sorrateiramente. A minha mãe pegou num guarda-chuva branco que abriu para mim e noutro preto para ela, e seguimos pela rua até chegar à tua casa. O meu coração parecia que ia saltar pela boca tal era o meu entusiasmo.
Quando cheguei a tua casa tive de lavar as mãos muito bem, por indicação da tua mãe. Tu estavas no sofá da tua enorme sala. Sentada. Aproximei-me de ti, lentamente, parecias estar a dormir. As nossas mães estavam logo atrás a falar muito baixinho. Sentindo que eu me aproximava levantaste o rosto para mim e sorriste:
- Anita…
A tua voz era frágil, e o teu rosto muito magro. Os olhos pareciam saltar-te da face e a tua boca e nariz estavam tapados por uma máscara. Parei pois, devo confessar-te, assustei-me um pouco. Tu baixaste os olhos ciente da tua nova condição. Mas eu, encorajada pela força do amor, aproximei-me e sentei-me ao teu lado:
- Como estás, Amália?
Senti que sorrias por baixo daquela máscara.
- Melhor, agora que estás aqui.
As nossas mães deixaram-nos sós na sala, não sem antes me avisarem que não te podias cansar.
- Posso dar-te a mão? - perguntei a medo.
Tu acenaste com a cabeça e estendeste a tua mão que eu agarrei com delicadeza. Contaste-me como tinham sido os teus dias. A operação que não te tinha deixado cicatrizes, pois foi a laser, fosse lá isso o que fosse. Eu ouvia-te fascinada a contares que te tinham tirado umas células, pelo nariz, que eu supus serem o bichinho mau que a minha mãe falou. Parecias uma adulta a falar. Contaste que havia lá no hospital outros meninos, como tu.
- Eu rezei todos os dias por ti. - disse-te eu.
Tu sorriste, novamente, por baixo da máscara. Estavas já cansada, e notava-se a falar.
- E agora já passou? - Perguntei.
- Ainda não. Ainda tenho de fazer muitos tratamentos. Mas as pessoas são muito minhas amigas e divertidas. Custa menos assim.
Eu já não sabia o que te dizer. Podia contar-te as coisas da escola, mas pensei que não quisesses saber. Eu não te podia cansar. Por isso fiquei calada, a ver o filme que estavas a ver antes de eu chegar. Acabaste por adormecer. E eu fiquei ali a segurar a tua mão. Parecias tão frágil agora. Ouvi os passos e as vozes das nossas mães a chegarem e fiz de conta que também estava a dormir, na esperança de que me deixassem ficar ali mais um bocadinho."

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