Avançar para o conteúdo principal

despedida



"Uma noite, enquanto estávamos sentados no sofá, tu com o teu tablet e eu a ver televisão, leste-me uma frase que acabavas de ler no facebook “O que é mais fácil, amar, perdoar ou esquecer?” Não te respondi, porque não sabia a minha resposta, mas sabia a tua.
Foram 15 anos de casamento e, talvez, nunca me tenhas amado mais do que ao bife que te colocava no prato, ou ao pó que limpava na tua garagem. Deixaste de gastar obrigados comigo, deixaste de me sorrir, de me ver. Deixaste-me só, mesmo quando te sentavas comigo à mesa, quando ficavas ao meu lado no sofá e quando dormias na mesma cama. Tão só. Só me restava a esperança do teu amor apagado, que a todo o custo tentei reanimar. Mudei o meu visual, fui para o ginásio para que não mais me disseste que fiquei gorda. Tratei sozinha do nosso filho, para que não te aborrecesses depois do trabalho. Aprendemos a viver só! Os dois. Sós. Se é que podemos chamar vida a uma coisa sem amor. Amei-te com a maior das facilidades, perdoei as tuas infidelidades físicas e pessoais, as tuas ausências, a tua alienação. Perdoei… O mais difícil será esquecer. Não esquecer-te porque não o quero. Mas esquecer-me para me encontrar novamente. Desistir para lutar. Adormecer esta noite neste passado, para amanhã acordar num novo futuro.
Vou partir na certeza de que não me seguirás. Por isso, tanto adiei esta partida. Parto hoje como no dia em que partiste.
O aniversário do Afonso será no sábado, às 15h, no sítio do costume, está tudo tratado. Tens o presente para lhe oferecer na prateleira de cima da despensa. Irás como pai, é bom que vás. Tens comida no congelador para uns dias e no forno empadão."



----
Texto: Susana Silva
Imagem: pixabay

Comentários