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cadeira de três pernas



Era dia de mercado, o dia mais agitado da semana. A vila em peso, deixava os seus afazeres medievais para ir ao mercado trocar as suas moedas de bronze por produtos necessários à sua sobrevivência.
Afonso seguia com os seus pais e com os três irmãos mais novos passando revista às fileiras de barracas que se amontoavam naquele descampado agora imensamente povoado. Grelos e nabos em todas as bancas, só de olhar e de lembrar o sabor amargo do nabo sentia-se nauseado. A mãe parou no ferreiro, precisava de uma nova foucinha que a dela partira durante a semana ao apanhar pasto para os animais. Enquanto esperava Afonso reparou num moço que amontoava cadeiras preparando-se para as vender. Fazia-o com afinco, mas desajeitado, mas o que mais surpreendeu Afonso é que as cadeiras só tinham três pernas. O vendedor coloca um letreiro que diz “10 moedas”… Afonso ficou boquiaberto, dez moedas era o que uma família de muito trabalho conseguiria angariar durante um mês. Riu-se com desdém do parvo vendedor, enquanto o via, confiante, a preparar a sacola e o chapéu de pele que trazia na cabeça enquanto subia para a banca e preparava-se para apregoar o seu produto sem, no entanto, conseguir atrair a atenção de ninguém.
Olha a cadeira de três pernas, quem quer? Só hoje, pelo fantástico custo de 10 moedas… Olha a cadeira de três pernas…
Face ao ridículo pregão algumas famílias haviam-se juntado em volta do jovem com gargalhadas, não o demovendo da confiança com que continuava a apregoar a sua cadeira de três pernas.
― Mas para que querem as pessoas uma cadeira de três pernas, afinal? ― questionou o carpinteiro que estava ali mesmo ao lado ― não me digas que te acabou a madeira para fazer a outra perna…
A gargalhada foi geral, mas, estranhamente, o vendedor não se sentiu intimidado, pelo contrário, agora gritava mais alto para a multidão que se juntara à sua volta.
― A cadeira de três pernas é o melhor produto alguma vez inventado. ― afirmava, sem responder com clareza aos que o assistiam e estavam todos intrigados.
―Ai sim, diz-me lá ― continuava o carpinteiro que se tinha tornado o inquiridor da situação ― porque razão uma cadeira de três pernas é a melhor coisa inventada?
Sem responder à questão o vendedor da cadeira de três pernas adiantou:
― Na vila ao lado vendi todas as cadeiras de três pernas, os fidalgos compravam e o povo também. ― A multidão começou a entreolhar-se questionando o que teria de tão especial esta cadeira que até os vizinhos da aldeia ao lado que eram uns esfarrapados tinham comprado. ― Todos compraram a cadeira de três pernas ― continuou ― e querem mais. E querem mais.
Um ávido burburinho ocupou toda a multidão enquanto o vendedor continuava o seu discurso:
― Até El-rei tem uma e ofereceu a cada um dos fidalgos da sua corte uma cadeira de três pernas trazendo a felicidade e a prosperidade a todos. ― afirmava tendo elevado a voz que estava quase em êxtase, perante uma multidão deslumbrada.
― Eu quero uma ― ouviu-se um grito por entre a multidão que abriu como as águas do mar vermelho para deixar passar Moisés. O carpinteiro, que queria descobrir a feitiço desta cadeira, caminhava agora, em direção ao vendedor da cadeira de três pernas e abrindo a sacola tirou de lá dez moedas que trocou pela cadeira.
A multidão ficou num alvoroço. Todos queriam comprar a cadeira da prosperidade, só para não ficar atrás da aldeia vizinha, mesmo que para isso gastassem tudo o que tinham no bolso.
Era como dar milho a pintainhos, todos saíram do mercado felizes com a sua cadeira de três pernas e o vendedor saiu com a bolsa cheia de moedas.

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