Ela era linda, parecia saída de um conto de era uma vez em
que belas jovens são humildes e confiantes em si próprias, gratas com tudo o
que a vida lhes traz. O seu ar de menina mulher, com um atrevimento
envergonhado no olhar e o samba no andar despertavam as mais secretas invejosas
que lhe sorriam com falsidade. Mas não era assim que ela se via, o cabelo
difícil de conter, o dente desalinhado e os saltinhos do andar envergonhavam-na
e, no silêncio da sua casa, chorava muitas vezes, de solidão. Tinha tanto o que
os outros invejavam, como aquilo que sentia que lhe faltava. É assim, estranha,
a vida.
A vida corria-lhe de feição, trabalhava numa empresa como
diretora financeira, ia ao ginásio todos os dias, vivia com o namorado com quem
mantinha uma feliz relação desde a juventude, não fosse a sua insegurança
consigo própria e iria viver feliz para sempre. Mas ela era tudo menos um caso
de sucesso. Sentia-se frágil e insegura, achava-se feia e envergonhava-se do
seu gingar, fruto de um pé partido aos doze anos num jogo de voleibol. Era
conflituosa com todos quantos gostavam dela porque não aceitava para consigo
aquilo que ela própria não sentia. Era um caso de desamor crónico.
Se fosse num conto de fadas, ela iria recuperar desse
desamor e compreender a importância da verdadeira beleza, mas não era. Era a
vida real e ela iria desamar-se até ao fim dos seus dias.
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